sábado, abril 23, 2011

Jesus Vive! Padre José Assis

No Domingo da Páscoa a Igreja ora: “Ó Deus, por vosso Filho Unigênito, vencedor da morte, abristes hoje para nós as portas da eternidade...” (Oração Coleta) Cristo ressuscitou! Venceu a morte, submeteu o Principe deste mundo. A luz venceu as trevas, por isso este dia é o mais glorioso para a humanidade, em especial para os cristãos: “Este é o dia que o Senhor fez para nós: alegremo-nos e nele exultemos! (Sl 117) O “shabat”, o sábado, o “dia do descanso de Deus” da Antiga Aliança, cede lugar ao Domingo, a grande festa da Igreja.
“Sem o Domingo de Páscoa, não teríamos conhecido a história de Jesus. Se sua história tivesse terminado com a crucificação, ele provavelmente teria sido esquecido – mais um judeu crucificado pelo império romano num século sangrento que testemunhou milhares de execuções assim... De fato, sem o Domingo de Páscoa nem haveria a “Sexta-feira Santa”, porque não existiria uma comunidade durável para lembrar e dar sentido à sua morte. O Domingo de Páscoa sem a Sexa-feira Santa cai no sentimentalismo e no vazio. Torna-se uma afirmação de que a primavera vem depois do inverno, que a vida vem depois da morte, que as flores nascerão de novo e que é tempo de ovos e coelhinhos. Mas a Páscoa como anulação da Sexta-feira significa que Deus vindicou a paixão de Jesus para o reino de Deus, a justiça de Deus e o “não” de Deus aos poderes que o mataram, poderes que ainda estão muito vivos no mundo. O Domingo de Páscoa fala tanto de Deus quanto de Jesus. A Páscoa revela o caráter de Deus. A Páscoa significa que a Grande Limpeza feita por Deus no mundo começou – mas não acontecerá sem nós.” (Borg, 2007.)

Na Carta Apostólica “Dies Domini” de João paulo II ele nos apresenta como o dia do Senhor foi definido desde os tempos apostóicos e nos faz um apelo a que mesmo no contexto das dificuldades do nosso tempo, a identidade deste dia deva ser salvaguardada e, sobretudo, vivida profundamente: «“Nós celebramos o domingo, devido à venerável ressurreição de nosso Senhor Jesus Cristo, não só na Páscoa, mas inclusive em cada ciclo semanal”: assim escrevia o Papa Inocêncio I, no início do século V, testemunhando um costume já consolidado, que se vinha desenvolvendo logo desde os primeiros anos após a ressurreição do Senhor. S. Basílio fala do ”santo domingo, honrado pela ressurreição do Senhor, primícia de todos os outros dias”. S. Agostinho chama o domingo “sacramento da Páscoa”... Um autor oriental, do início do século III, conta que em toda a região os crentes, já então, santificavam regularmente o domingo. A prática espontanea tornou-se depois, norma sancionada juridicamente: o dia do Senhor ritmou a história bimilenária da Igreja. Como se poderia pensar que ele deixe de marcar o seu futuro? Os problemas que, no nosso tempo, podem tornar mais dificil a prática do dever dominical, não deixam de sensibilizar a Igreja permanecendo maternalmente atenta às condições de cada um dos seus filhos. De modo particular, ela sente-se chamada a um novo esforço catequético e pastoral, para que nenhum deles, nas condições normais de vida, fique privado do abundante fluxo de graças que a celebração do dia do Senhor traz consigo... No limiar do Terceiro Milênio, a celebração do domingo cristão, pelos significados que evoca e as dimensões que implica, relativamente aos fundamentos mesmos da fé, permanece um elemento qualificante da identidade cristã. (João Paulo II, 1998.)

Com o alvorecer do primeiro dia da semana, o “Dies Domini”, o dia do Senhor, o “Dies Christi”, o dia do Senhor Ressuscitado; com o primeiro Domingo da história amanhecia uma nova era, a era cristã.

“Após o sábado” (Mt 28, 1a), “no primeiro dia da semana, Maria Madalena vai ao sepulcro, de madrugada, quando ainda estava escuro e, vê que a pedra fora retirada do sepulcro.” (Jo 20,1) Depois de um longo sábado era madrugada quando Maria Madalena, empurrada por seu amor a Jesus vai até o túmulo, ela estava ansiosa para prestar-lhe um último gesto de carinho. A morte não lhe assusta porque o amor é mais forte. O carinho, com efeito sobrevive mesmo depois da morte daqueles que amamos. O amor intui que o ser amado segue presente de alguma forma, próximo e íntimo como sempre, e inclusive mais ainda.

Maria Madalena é a primeira testemunha da ressurreição. Recebe a notícia com alegria da boca mesma de Jesus: “Não temais! Ide anunciar a meus irmãos que se dirijam para a Galiléia; lá me verão”. (Mt 28,10) E a compartilha em seguida com o resto dos discípulos.

O Evangelho de São João (Jo 20, 1-9) deste domingo de Páscoa tem muito da linguagem cinematográfica. O apóstolo protagonista do relato de hoje o guardava muito vivo em sua memória, disso não cabe a menor dúvida, já que seria escrito muitos anos depois, pelo mesmo, segundo a tradição. «Como Mateus, Marcos e Lucas, João começa sua história do Domingo de Páscoa com o túmulo vazio (Jo 20, 1-10), mas ela é contada de modo bastante diferente. Em vez de várias mulheres, apenas uma é mencionada: Maria Madalena. Ela vê que a pedra foi rolada mas não entra no túmulo. Em vez disso chama Pedro e o discípulo amado, que correm ao túmulo, entrram e o encontram vazio, a não ser pelos panos funerários.» (Borg, 2007.) Pedro e João corriam juntos, mas “o outro discípulo” correu mais depressa que Pedro e chegou primeiro ao sepulcro. João corria mais, era mais jovem. Mas não entra, talvez por algum tipo de temor, ou mais provavelmente por respeito à hierarquia declarada e admitida de Pedro. Descreve o evangelista a cena e a posição – panos e sudário – dois elementos que havia na gruta. “Inclinando-se, viu os panos de linho por terra, mas não entrou. Então, chega também Simão Pedro, que o seguia, e entra no sepulcro; vê os panos de linho por terra e o sudário que cobrira a cabeça de Jesus... Então, entrou também o outro discípulo que chegara primeiro ao sepulcro: viu e creu.” (Jo 20 3-8)

Pedro e o “outro discípulo” entram no sepulcro, que é como “entrar” no plano de Deus, vê-lo de perto, e encontram todas as respostas às suas perguntas, e entendem a cruz como sinal de amor. “Entram” no sepulcro e então vêm, crêm e entendem tudo. E, também o compartilham com os outros. É a hora de reconhecer antes de tudo a vocação, a missão e o lugar da mulher na Igreja, elas foram as primeiras testemunhas e “apóstolas”, as primeiras enviadas a anunciar a todos esta grande notícia. Podemos nos sentir como as mulheres, enviados ao mundo inteiro, à nossa “Galiléia” particular, a anunciar e dizer a todos que nosso Deus é um Deus dos vivos, que está vivo e acompanha nossa vida, que a morte já não tem nenhum poder sobre nós, que temos que viver cada dia, e ver a Deus perto nessa vida cotidiana.

A Ressurreição de Jesus Cristo é um dogma cristão fundamental no qual se fundamentam, como pensava Santo Agostinho, todas os ensinamentos cristãos. Nenhum dos discípulos e seguidores de Jesus foi testemunha ocular do momento da ressurreição. As duas razões principais que apresentam os Apóstolos para fundamentar sua fé na Ressurreição de Jesus são o sepulcro vazio e as aparições do Ressuscitado a algumas pessoas. Nenhuma destas duas razões pode demonstrar cientificamente nossa fé na Ressurreição, e de acordo com as exigências da história e da ciência empírica atual. Por isso nossa fé na Ressurreição é um dogma de fé uma verdade revelada, não uma verdade empírica e cientificamente demonstrável. Mas, o mais importante não é o como da Ressurreição de Jesus, e da nossa própria ressurreição; O realmente importante é que nós façamos de nossa fé na ressurreição uma experiência vital que nos impulsione a viver como pessoas ressuscitadas.  

A Páscoa nos faz uma primeira afirmação: «Jesus vive. Ele continua a ser percebido depois da morte, ainda que de um modo radicalmente novo. Não é mais uma figura em carne e sangue, confinada ao tempo e ao espaço, e sim uma realidade que pode entrar em salas trancadas, viajar com seguidores sem ser reconhecido, ser experimentado tanto na Galiléia quanto em Jerusalém, desaparecer no momento em que é reconhecido e permanecer com seus seguidores “até o fim dos tmpos”... a verdade da afirmação “Jesus vive” baseia-se na experiência dos cristãos ao longo dos séculos, mas nem todos os cristãos tiveram essa experiência. Ela não é essencial. Citando um dos trechos da Páscoa contado por João, “Bem-aventurados os que não viram e acreditaram”. Mas alguns cristãos, até os dias atuais, experimentaram Jesus como uma realidade viva. Para nós, esta é a base de expreriência da primeira das afirmações centrais da Páscoa: Jesus continua a viver e a atuar. O espírito, a presença, que seus seguidores conheceram Nele antes da morte, continua a ser conhecida. Jesus vive.” (Ibid. Borg, 2007.)

A fé na ressurreição tem sido para muitas pessoas, uma força interior profunda que lhes ajudou a suportar grandes dificuldades. Santo Inácio de Antioquia (séc. II), escrevia aos fiéis cristãos, quando ia a caminho do martírio, que desejava ser triturado pelos dentes das feras, para poder assim oferecer-se a Cristo, como pão triturado e imolado, e unir-se definitivamente com o Ressuscitado. Este mesmo sentimento, experimentaram alguns dos apóstolos e discípulos e discípulas de Cristo, quando caminhavam para o martírio. A fé na Ressurreição foi para essas pessaos força maior que o medo da morte. Foi sua fé na ressurreição a que lhes converteu em testemunhas valentes e em mártires cristãos.

Muitas das realidades deste mundo nos pareceriam inexplicáveis, se suprimirmos nossa fé na Ressurreição. Vivemos em mundo no qual a injustiça e a mentira triunfam por toda parte. Os justos não têm, neste mundo, melhor sorte que os injustos. É nossa fé na ressurreição a que nos diz que vale a pena seguir intentando ser justos, ainda que por isto tenhamos que sofrer até o martírio. Deus nos ressuscitará, como ressuscitou a Jesus, em nosso último dia, e nos julgará segundo nossas obras e sua infinita misericórdia.

Nossa fé e nossa esperança na Ressurreição iluminam nossa difícil caminhada. Aí encontramos uma segunda afirmação das narrativas da Páscoa: «Deus disse “sim” a Jesus e “não” aos poderes que o executaram. A Páscoa não trata de uma vida após a morte ou de finais felizes. A Páscoa é o “sim” de Deus a Jesus contra os poderes que o mataram... Os autores dos evangelhos não falam da ressurreição de Jesus sem comentar sua crucificação ordenada pelo conluio entre colaboradores e o poder imperial. Nas palavras da mais antiga e disseminada afirmação pós-Páscoa sobre Jesus no Novo Testamento, Jesus é o Senhor. E se Jesus é o Senhor, os senhores deste mundo não o são. A Páscoa afirma que os sistemas de dominação deste mundo não são obra de Deus e não têm a última palavra.” (Ibid. Borg, 2007.)

Neste Domingo de Páscoa renovando nossa fé, cremos, como Maria Madalena, como Pedro e “o outro discípulo”; que “Jesus vive” e Deus disse “sim a Jesus e “não” aos poderes deste mundo. Este Domingo é o dia para viver e comunicar a esperança em que a morte não poderá com a vida porque Deus está conosco e nos empurra nesta mesma direção. Esta é a razão mais profunda de nossa fé e nossa esperança. Cremos no Deus da vida e isso nos faz protetores da vida. Hoje é o dia para sair ao mundo e gritar com nosso testemunho e com nosso estilo de vida: “Aleluia! Aleluia!” Feliz Páscoa da Ressurreição! Que o encontro com Cristo Ressuscitado seja para nós um motivo para viver, para esperar e para crer que o Deus da Vida está a nosso favor.



Bibliografia



Textos e referências bíblicas: Bíblia de Jerusalém. São Paulo, Paulus, 2002.

Borg, Marcus J.; Crossan, Joh Dominik. A última Semana, um relato detalhado dos dias finais de Jesus. Rio de Janeiro, Editora Nova Fronteira, 2007.

João Paulo II. Carta Apostólica Dies Domini, sobre a santificação do Domingo. São Paulo, Paulinas, 1998.

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