
“O nascimento de Jesus o Messias aconteceu assim: Sua mãe, Maria, estava prometida a José, e antes do matrimônio engravidou por obra do Espírito Santo. José, seu esposo, que era honrado e não queria difamá-la, decidiu repudiá-la privadamente.” (Mt 1, 18-19) «A situação jurídica de Maria e José que supõe Mateus parece clara à luz dos costumes matrimoniais judeus. “Ela e José já estavam comprometidos pelo casamento, mas aguardavam aquele período costumeiro, antes da vida conjugal, que mantinha separados, pelo contrato de casamento, o marido e a mulher. O casamento, contratado desde cedo pelos pais, quase sempre se realizava logo depois da puberdade; mas a moça continuava a viver com os pais por algum tempo, depois do casamento, até que o marido fosse capaz de sustentá-la em sua casa ou na casa de seus pais. E as relações sexuais não eram permitidas durante esse período. No entanto, Maria tinha agora uma criança. O que José podia fazer?» (Ibid. Brown.)
O evangelista não suaviza a dramática situação e os efeitos de uma decisão de José em repudiar secretamente sua esposa. A situação é angustiosa e a solução complicada. Normalmente ou em muitos comentários se resolve apresentar o fato, da “dúvida de José” com uma possível traição de Maria, como se ela fosse pecadora já que estando desposada, para o mundo judeu pertencia totalmente ao esposo, aparecendo grávida, José a poderia repudiá-la, conforme a lei do deuteronômio, por ter cometido adultério (cf. Dt 22,23-38). Por que não colocamos de outra maneira este fato da dúvida de José? «São Mateus caracteriza a personalidade de José atestando que ele era um homem “justo” (cf. 2,25). Justo vai além de nossa compreensão usual de justo, que é a pessoa que dá valor exato às pessoas e às coisas, que age com retidão, que ama o direito e observa as leis. A visão bíblica comporta esses elementos e outros mais. Existe uma verdadeira espiritualidade do “justo”... É a pessoa que vive intensamente a ordem do amor a Deus, cultivando grande intimidade com Ele, sensível a seus desígnios, expressos pela lei como manifestação viva de sua vontade... Esse homem com essas características se transforma num justo quando ganha irradiação na comunidade, educa pelo exemplo os mais jovens, conquista, pela conduta íntegra, a confiança dos demais e se torna uma referência coletiva. Sua vida mostra a verdade do seu fervor religioso e sua inteireza o torna um modelo de adesão a Deus. O conjunto desses valores constitui o “justo” na compreensão bíblica.» (Boff, 2005.) Sendo José um homem “justo” não temos motivos com base no texto de Mateus, para pensar que ele duvidou da honestidade de Maria. O estado de Maria criava o problema unicamente para José. Parece-nos de todo normal que ele pelo mensageiro divino foi introduzido no mistério da maternidade de Maria sua noiva. «A descoberta da gravidez de Maria já trouxe o conhecimento de que tinha sido através da ação do Espírito Santo. A decisão de José de divorciar-se dela originou-se de seu respeito ou reverência a esta divina intervenção, da qual ele já sabia quando o anjo lhe apareceu. Este conhecimento deu a ele um senso de indignidade em relação a Maria e uma relutância em entrar numa vida conjugal comum com um instrumento de Deus. Esta interpretação é linguisticamente possível; e ela poupa José de sempre ter pensado que Maria poderia comportar-se vergonhosamente”. (Ibid. Brown.)
Portanto, a dúvida ante o fato milagroso não nasce sobre a culpa ou inocência de Maria, mas sobre o papel que José pessoalmente tem que assumir ante esta ação de Deus e aqui podemos por o anúncio do anjo em sonho revelando-lhe sua missão: “José, filho de Davi, não tenhas medo de acolher Maria como tua esposa, pois o que ela concebeu é obra do Espírito Santo. Dará à luz um filho, a quem tu chamarás Jesus, porque ele salvará seu povo de seus pecados”. (Mt 1, 20-21) Ser perante a lei o pai legal, dar o nome e educar o menino que vai nascer. Uma vez conhecido o papel que ele tinha que fazer neste matrimônio, com respeito ao filho, José sentiu-se livre da dúvida da qual era a sua missão nesse matrimônio e mediante a obediência da fé, assume a sua paternidade humana em relação a Jesus, confiando na luz do Espírito Santo que por meio da fé se doa e por certo foi descobrindo a cada dia o significado desta sua paternidade. «Como se deduz dos textos evangélicos, o matrimônio com Maria é o fundamento jurídico da paternidade de José. Foi para garantir a proteção paterna a Jesus que Deus escolheu José como esposo de Maria. Por conseguinte, a paternidade de José – uma relação que o coloca o mais perto possível de Cristo termo de toda e qualquer eleição e predestinação (Rm 8,28-29) – passa através do matrimônio com Maria, ou seja, através da família... O crescimento de Jesus “em sabedoria, em estatura e em graça” (Lc 2,52), deu-se no âmbito da Sagrada Família, sob o olhar de São José, que tinha a alta função de “o criar”; ou seja, de alimentar, vestir e instruir Jesus na Lei e num ofício, em conformidade com os deveres estabelecidos para o pai... A Escritura sabe que Jesus não nasceu do sêmen de José; E, todavia não lhe é tirada a autoridade paterna, uma vez que lhe é ordenado que seja ele a dar o nome ao menino... » (João Paulo II, 1989) (Ibid. João Paulo II)
A identidade de Jesus, como filho de Davi, está no plano de Deus desde toda eternidade, mas José deve dar àquele plano uma obediência cooperativa, própria de um homem “justo”. Para Mateus a concepção por obra do Espírito Santo é o que faz de Jesus Filho de Deus. Esta mensagem evangélica tem implicações para todos nós. É necessário que o homem (José) e a mulher (Maria) colaborem no acontecimento da salvação. Deus não anula a decisão livre de sua criatura, conta sempre com ela inclusive ariscando-se ao fracasso de sua obra.
Nestes dias, no umbral da vinda iminente do Senhor, às vésperas do seu Natal nos voltamos para a figura silenciosa do Advento, São José. Ele é um modelo de fé e aceitação dos planos de Deus sobre nossas vidas. Ele é modelo de absoluta confiança e plena disponibilidade para todo cristão. Seu trato íntimo e familiar com Deus na figura daquele menino que ele o amava com ternura e profundidade; que crescia ante seus olhos e ao qual ensinava sua própria profissão de carpinteiro, que o servia com generosidade e protegia com todas as suas forças; seu próprio silêncio faz de São José mestre de oração para todo cristão.
Outra lição nos vem por outra faceta da vida do patriarca, são os seus cinco sonhos, através dos quais, Deus interveio com suas divinas instruções e após cada um deles José imediatamente obedeceu e executou com fidelidade as ordens do Senhor. A sua incondicional e pronta adesão à esta vontade salvadora nos deveria iluminar. Na vida de José ela cresce ante as dificuldades e contratempos que vão surgindo nos dias atribulados do nascimento do menino: encontrou um lugar, um abrigo para a Virgem e o menino; livrou Maria e o menino de tantos perigos que tiveram que correr; acompanhou e consolou Maria na aflição de ter perdido o menino em Jerusalém. Em tudo nenhuma palavra de queixa se escapa de seus lábios. Aceita e faz em cada momento o que tinha que fazer. Que unidos a José e Maria nos aproximemos do Natal e eles nos indiquem caminhos para que a experiência do Natal seja para nós como foi para eles esta experiência do encontro dialogal de vontades, a de cada um de nós com a vontade salvadora de Deus.
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Bibliografia:
Citação de textos bíblicos - Schökel, Luis Alonço. Bíblia do Peregrino, São Paulo, 1997.Brown, Raymond E. Um Cristo que vem no Advento, ensaios sobre as narrativas evangélicas em preparação para o nascimento de Jesus (Mateus I e Lucas I). São Paulo, Ave Maria, 1996.
Boff, Leonardo. São José a personificação do Pai. Campinas (SP) Verus Editora, 2005.
João Paulo II, Exortação Redemptoris Custos, sobre a figura e a missão de São José, Cidade do Vaticano, Libreria Editrice Vaticana, 1989
Padre Assis
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