

No terceiro Domingo do Advento a Igreja o chama de “Domingo da Alegria”, fundamentalmente pela proximidade do grande acontecimento do Natal. Porém não se trata de qualquer alegria, «a alegria do mundo procede de coisas exteriores: nasce precisamente quando o homem consegue escapar de si próprio, quando olha para fora, quando consegue desviar o olhar do seu mundo interior, que produz solidão porque é olhar para o vazio. O cristão leva a alegria dentro de si, porque encontra a Deus na sua alma em graça. Esta é a fonte da sua alegria... a alegria do mundo é pobre e passageira.
A alegria do cristão é profunda e capaz de subsistir no meio das dificuldades. É compatível com a dor, com a doença, com o fracasso e as contradições. “Eu vos darei uma alegria que ninguém vos poderá tirar” (Jo 16,22) prometeu o Senhor... A nossa alegria deve ter um fundamento sólido. Não se pode apoiar exclusivamente em coisas passageiras: notícias agradáveis, saúde, tranquilidade, situação econômica desafogada, etc., coisas que em si são boas se não estiverem desligadas de Deus, mas que por si mesmas são insuficientes para nos proporcionarem a verdadeira alegria.» (Carvajal, 1995.) Para mim isto de alegria me recorda que o evangelho sempre é motivo da alegria, porque é uma “boa notícia”, ou pelo menos será.
Se não o é, talvez não o tenhamos entendido bem, ou não o temos aprofundado suficientemente. Seria bom que nós cristãos recuperássemos a verdadeira alegria do Natal. A alegria de saber que o Menino Jesus, Deus mesmo, traz a justiça e a paz, e que só Ele pode dar, porque o mundo não possui o seu segredo. “Tende sempre a alegria do Senhor; repito: estai alegres.” (Fl 4,4) A alegria cristã é possível? O Advento é tempo de uma alegre esperança, mesmo que a nossa sociedade tenha comercializado o Natal, folclorizando ou instrumentalizando o Menino Jesus, tanto cultural como ideologicamente. Como ter esperança quando a sociedade moderna converteu a esperança cristã em mera expectativa humana e a libertação integral de Cristo em avanços científicos e materiais ou até messianismos políticos? Isaías em meio às dificuldades do exílio na Babilônia canta um cântico de esperança e alegria às grandezas dos tempos messiânicos (Is 35, 1-6a. 10).
O profeta-poeta «pinta com as mais vivas cores naturais, a terra de Judá e de Israel convertida no mais belo dos jardins, no melhor dos paraísos. Imagens, metáforas, hipérboles são manejadas por esta cálida fantasia oriental até extremos insuspeitáveis. É a expressão plástica do anelo de confiança total em Deus de um povo no desterro, carente de tudo aquilo que tinha constituído as delícias do seu coração... Será um caminho ‘sagrado’ porque conduzirá à Cidade Santa os ‘redimidos’, os libertados da servidão e da escravidão.
Será um Novo Êxodo do qual nascerá um Povo Novo habitante na Nova Jerusalém.» (Comentários à Bíblia Litúrgica) “O deserto e o ermo se regozijarão, a estepe florescerá, transbordando de júbilo e alegria; tem a glória do Líbano, a beleza do Carmelo e do Saron; eles verão a glória do Senhor, a beleza do nosso Deus.” (Is 35,1-2) O Profeta exorta o povo a manter a esperança através da imagem de uma caravana de repatriados, que se converte em uma procissão com cantos alegres, encabeçada pela Alegria; atravessa o deserto com seus campos áridos, paisagens nuas, terra seca e estéril como um areal. Um dia tudo isso se transformará através da abundância de água e florescerá: também nós às vezes sentimos nossa vida como terra, tão seca, tão estéril, tão árida! Essa sensação de inutilidade, essa impressão de estar sem nada que apresentar diante de Deus e das pessoas; este medo de não ter feito nada por Ele, nada que tenha realmente valor à hora da verdade.
Vida nossa, terra nossa, seca e pobre, um dia Deus realizará quem sabe também conosco, o prodígio de uma maravilhosa florada, promessa de ricos e abundantes frutos. Para o profeta que espera contra toda esperança, o deserto reverdecido como um canavial, como um pomar dará abundantes frutos e a caravana prosseguirá para a cidade ideal do mundo, Sião-Jerusalém.
O Advento é como esta caravana de Isaías, uma caravana viva em busca do Deus-conosco, o Emanuel. Mas, este Deus a quem buscamos já veio e virá novamente, quando será? A crise provocada pelo atraso da “parusia”, a volta gloriosa do Senhor, foi grave e inquietante na Igreja primitiva. Em um primeiro momento pensaram como o Apóstolo Paulo, que o Senhor voltaria logo, mas não foi assim, nesta tensão viveram e morreram os primeiros mártires. A carta de Tiago foi escrita no momento em que alguns cristãos levantavam graves questionamentos sobre a “parusia”: Quando acontecerá a volta do Senhor? Será que Ele voltará realmente? Tem sentido nossa esperança em meio a tantas perseguições? Tiago tenta responder: “Irmãos, tende paciência até que venha o Senhor... fortalecei o ânimo, pois a chegada do Senhor está próxima... o juiz está à porta.” (cf. Tg 5, 7-10) Somos frequentemente impacientes, já que inconscientemente buscamos eficácia, objetividade; desejamos tocar em resultados imediatos. Advento é tempo de paciência e esta é fruto do amor, quem ama espera. Portanto, é necessário exercitar a paciência entendida como resistência, tenacidade ou compromisso. “Cremos que o Senhor virá, para julgar os vivos e os mortos”, esta certeza exige do cristão a firmeza.
A paciência e a firmeza são imprescindíveis. Para afirmar isso Tiago usa o exemplo do agricultor, pois não há nada como a paciência do lavrador esperando as chuvas, pois ele depende delas. O agricultor palestinense e daqui da nossa região do semiárido nordestino depende desta intervenção de Deus, ele sabe que de nada vale desesperar-se, porque as chuvas chegarão apesar da longa seca, como bênçãos salvarão sua colheita. Quanta paciência tem Deus conosco! Deus espera nossa maturidade pessoal e tem paciência.
Os ritmos e os tempos de Deus não são os nossos. Deixemos que Ele leve o ritmo da nossa vida e a salvação virá, a alegria será presente e descobriremos que temos merecido a pena da espera, o esforço e o sofrimento, porque a alegria é fruto de tudo isso. Fruto de Deus em nossas vidas. O evangelista Mateus (cf. Mt 11,2-11) ressaltou que João Batista, no silêncio da prisão, se interrogou se é realmente Jesus, de quem ouviu tantas maravilhas, o verdadeiro Messias. O modo de comportar-se de Jesus se encaixa realmente com a imagem do Messias? Angustiado e na dúvida João decide então enviar mensageiros para perguntar diretamente a Jesus: “És tu o que há de vir ou devemos esperar outro?” (Mt 11,3) É possível que nesta cena se reflita uma história real, não de enfrentamento entre João Batista e Jesus, mas sim de pontos de vista distintos.
O “precursor”, homem do Antigo Testamento, está desconcertado, a dúvida acerca da messianidade de Jesus não é chocante, mas é sinal de uma profunda honestidade. João tinha posto suas esperanças em Jesus, mas parece que as coisas não estão acontecendo como ele deseja: Um Messias como “Juiz” para dar início ao “juízo de Deus”. Jesus, ao contrário se apresenta como o “Salvador”, aproximando-se dos pecadores e lhes oferecendo o amor de Deus e a salvação. Jesus lhe responde com uma resposta positiva, dizendo que está levando a cabo o que se anunciou pelo profeta Isaías. Ele está mobilizando a caravana de pecadores pelo deserto da vida para chegar à cidade de Sião: “Ide informar a João sobre o que ouvis e vedes: Cegos recobram a visão, coxos caminham; leprosos são purificados, surdos ouvem; mortos ressuscitam, pobres recebem a boa notícia." (Mt 11,4-6) Ora, se Jesus realizou estas obras, é porque Ele é o Messias.
Sabemos que Jesus era especialmente aficionado ao profeta Isaías; seus oráculos, suas imagens ele gostava de os usar para falar da chegada do Reino de Deus. Mateus, que é o evangelista que mais cita o Antigo Testamento, descrevendo o modo de ser de Jesus, de sua práxis e seu compromisso ante os enviados de João Batista nos oferece uma alusão implícita da profecia de Isaías: “Os olhos do cego se desgrudarão, os ouvidos do surdo se abrirão, o coxo saltará como cervo, e a língua do mudo cantará...” (Is 35,5-6; 61,1-2) “A finalidade teológica do evangelista com a formulação da resposta baseada em alusões implícitas ao Antigo Testamento é vidente: Jesus é o Messias prometido e esperado pelos profetas antigos; não é necessário esperar outro. Com Jesus irrompem os tempos messiânicos e o Reino escatológico de Deus é anunciado.
Nenhum comentário:
Postar um comentário